Autora: Ieda Marcondes


Publicado originalmente em junho de 1905, “Hereges” é o primeiro trabalho polêmico importante do jornalista e escritor inglês G.K. Chesterton. Pouco antes disso, ele havia se envolvido numa série de controvérsias com o editor do jornal Clarion, Robert Blatchford ‒ quem, curiosamente, abriu espaço em seu jornal para uma série de respostas do próprio Chesterton. Tais respostas e os seus artigos no jornal Daily News são a matéria-prima principal da visão única de vida que ele apresenta em “Hereges”.

Nascido em 1874, quando a religião e a ética vitoriana já estavam enfraquecidas, Chesterton foi criado em ambiente anglicano, mas, de acordo com o próprio autor, com pouco ou nenhum incentivo à crença ou prática religiosa. Em sua autobiografia, ele define o período de 1892 a 1895 como uma época de pessimismo e desespero, de uma obsessão incontrolável por idéias e imagens horríveis que o levavam a mergulhar cada vez mais fundo em um suicídio espiritual. Depois de certo tempo imerso nas “profundezas obscuras do pessimismo contemporâneo”, ele se revolta e cria, então, a teoria rudimentar de que a mera existência, reduzida aos seus limites primários, é extraordinária o suficiente para ser excitante. Conectado aos restos de um pensamento religioso por uma linha fina de gratidão, ele começa a ler os evangelhos; termos e imagens religiosas começam a aparecer cada vez mais em suas anotações.

Em 1896, Chesterton conhece sua futura esposa, Frances Blogg, quem exerce grande influência religiosa por toda a sua vida ‒ junto de outras figuras como o padre anglicano Conrad Noel e do historiador e escritor Hilaire Belloc. Já em 1904, em uma de suas respostas aos ataques de Robert Blatchford ao cristianismo no jornal Clarion, Chesterton diz, “Nós todos somos agnósticos até descobrirmos que o agnosticismo não vai funcionar”. Assim, com “Hereges”, é possível delinear o começo de um caminho que só chegaria ao seu destino em 1922, quando o autor finalmente se converte ao catolicismo.